• Anestesia e reação alérgica: importância dos cuidados na avaliação prévia do paciente

Embora seja um procedimento fundamental em muitas intervenções médicas, a anestesia gera riscos e, em alguns casos, pode desencadear reações alérgicas de diferentes intensidades. Isso, claro, gera receio nos pacientes e exige que os profissionais de saúde estejam preparados para lidar com essa condição.

Por isso é tão importante a avaliação prévia do paciente, pois configura-se no momento de mensurar de que forma a relação anestesia e reação alérgica pode se desenvolver, de acordo com as circunstâncias particulares de cada paciente.

 

O risco de desenvolvimento de reação durante a anestesia

Seja em casos de maior ou menor gravidade, é difícil traçar um panorama da incidência de episódios de reações alérgicas após a administração de anestesias, devido à variedade de medicações e heterogeneidades de estudos para tal estimativa1.

Ao todo, acredita-se que a incidência de quadros de hipersensibilidade varie entre 1 episódio a cada 1250 procedimentos até 1 episódio a cada 18.600 procedimentos3. De qualquer forma, dados apontam que as mortes por anafilaxia resultado de anestesia são mais elevadas do que aquelas oriundas de outras causas e no Brasil atingem percentuais que variam entre 3% e 9% de todos os episódios do tipo.

Logo, como não poderia deixar de ser, o risco de reações adversas durante todo o período perioperatório devido a administração de anestésicos é uma preocupação que deve estar no horizonte de todos os profissionais envolvidos neste processo.

Isso passa, em um primeiro momento, por compreender a nomenclatura adotada em diferentes quadros, uma vez que isso permite a correta avaliação das condutas adotadas, diferenciando quadros de hipersensibilidade, alergia e anafilaxia (ou choque anafilático)4:

 

Hipersensibilidade

Sinais ou sintomas reprodutíveis a partir da exposição a determinado estímulo, em doses toleradas por indivíduos saudáveis.

 

Alergia

Reação de hipersensibilidade desencadeada por mecanismo imunológico específico diante da exposição a determinado estímulo.

 

Anafilaxia

Reação de hipersensibilidade grave, sistêmica ou generalizada, que provoca risco à vida do paciente.

 

Nessa classificação, o termo alergia só deve ser empregado mediante a identificação de resposta imune compatível (um exemplo disso são a presença de IgE ou IgG).

 

As intervenções essenciais

Os diferentes graus de manifestações de hipersensibilidade diante da administração de componentes anestésicos fazem com que seja difícil, em um primeiro momento, identificar de forma rápida e precisa a presença do quadro de reação alérgica. Muito disso acontece pelo fato de que os diferentes tipos de reação são desencadeados por diferentes mecanismos e mediadores5.

De qualquer forma, o diagnóstico é clínico1 com base em avaliação de manifestação de sintomas principalmente no aparelho respiratório, cardiovascular ou tegumentar (composto por glândulas, unhas, cabelos, pelos etc.)1, ainda que nem todos apareçam em conjunto sempre.

Em determinados contextos, a progressão dos sintomas respiratórias e cardiovasculares pode ser rápida, o que torna necessário sempre levantar a suspeita de reação em curso mesmo sem sinais cutâneos visíveis. Portanto, é fundamental avaliar o diagnóstico diferencial e considerar a presença de quadros de hemorragia, hipovolemia ou mesmo resultado do uso de um nível inadequado de anestesia1.

Ao lado do diagnóstico ágil da condição, a indicação de intervenção para promover o controle envolve a administração de doses adequadas de adrenalina e a reposição do volume intravascular, sempre considerando as particularidades do paciente (caso ele seja criança, gestante ou tenha histórico de problemas cardiovasculares, por exemplo). Estabilizado o quadro, os profissionais devem avaliar a pertinência de prosseguir com o procedimento, mediante análise da urgência e do risco diante da gravidade da reação1.

 

A importância da avaliação prévia

Em geral, é difícil predizer a chance de um paciente ter qualquer reação alérgica devido a aplicação de anestésicos em diferentes procedimentos. Dessa forma, os profissionais precisam de protocolos de avaliação prévia cuidadosos e, quando necessário, submeter o paciente a testes que possam detectar os riscos desses episódios.

Na avaliação prévia, é essencial investigar quadros anteriores de hipersensibilidade ou alergia a outros fármacos, inclusive em intervenções cirúrgicas anteriores, analisar a condição física do paciente (por meio da classificação da American Society of Anesthesiologists), bem como o resultado dos exames pré-operatórios. Tais parâmetros nortearão todo o planejamento de manejo clínico ao longo do procedimento6.

Por fim, como anestesia e reação alérgica são apenas um dos temores que cercam todo o período perioperatório, cabe ao profissional anestesiologista informar ao paciente durante a avaliação prévia tudo o que ele considerar pertinente sobre tipo e a técnica de anestesia adotada, incluindo os possíveis efeitos colaterais e cuidados posteriores no pós-operatório. Tal atenção certamente ampara o paciente em um momento que costuma ser cercado de ansiedade e de dúvidas.

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Referências.

  1. Spindola, Maria Anita Costa, et al. "Atualização sobre reações de hipersensibilidade perioperatória: documento conjunto da Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA) e Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI)–Parte I: tratamento e orientação pós-crise." Revista Brasileira de Anestesiologia 70 (2020): 534-548.
  2. Kemps HI, Cook TM, Thomas M, Harper NJN. UK anaesthetists’ perspectives and experiences of severe perioperative anaphylaxis: NAP6 baseline survey. Br J Anaesth. 2017;119:132---9. 2.
  3. Mertes PM, Volcheck GW, Garvey LH, et al. Epidemiology of perioperative anaphylaxis. Presse Med. 2016;45:758---67.
  4. Johansson SGO, Bieber T, Dahl R, et al. Revised nomenclature for allergy for global use: Report of the Nomenclature Review Committee of the World Allergy Organization October 2003. J Allergy Clin Immunol. 2004;113:832---6.
  5. Garvey LH, Dewachter P, Hepner DL, et al. Management of suspected immediate perioperative allergic reactions: an international overview and consensus recommendations. Br J Anaesth. 2019;123:e50---64.
  6. Protocolo de Cuidados Durante a Avaliação Pré-anestésica. Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Acesso em 14 out 2022

 

Publicado em 08 de Maio de 2024

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